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Mais de um terço das brasileiras que vivem no campo sofrem agressões dos cônjuges

Segundo pesquisadora da UFMG, os dados da Organização Mundial da Saúde podem estar subestimados devido à naturalização da violência e medo de denunciar

Repórter Nacional

No AR em 08/03/2018 - 10:08

A violência contra a mulher não tem espaço definido. Ocorre em barracos e mansões, nas metrópoles e em cidades pacatas do interior. No Brasil rural, não é diferente. Mulheres camponesas são violentadas diariamente, dentro de casa, ou mesmo nas lutas por direitos.

A quebradeira de coco babaçu e coordenadora do Movimento de Quebradeiras de Coco Babaçu, Francisca Nascimento, sofreu recentemente uma tentativa de homicídio, por lutar ao lado de suas companheiras, por acesso à água numa propriedade no Piauí. Ela foi abordada por vizinhos que não concordam com o movimento. “Ele saiu de dentro de casa, e veio por trás de mim, pelas minhas costas, e quando eu me espantei foi ele pegando no meu braço. E quando eu senti ele pegando no meu braço, que eu me virei, ele já tava pegando a faca pra me furar, e aí eu gritei. Quando eu gritei, eu disse, “você tá louco?” e aí joguei a mão nele”.

A exemplo de Francisca, mulheres indígenas, camponesas, quilombolas também passam por situações parecidas ao lutarem por justiça no campo.  No entanto, pouco se fala sobre as agressões sofridas por mulheres na zona rural. E os índices, já defasados, são alarmantes. Há cerca de 10 anos, a Organização Mundial de Saúde apontou numa pesquisa que mais de um terço das brasileiras em áreas rurais são vítimas de agressões dos cônjuges.

O assunto virou tema de pesquisa de doutorado da psicóloga Aline Gomes Martins, na Universidade Federal de Minas Gerais. Para ela, os dados podem estar subestimados devido à naturalização da violência e o medo de denunciar. “As mulheres que vivem em zonas rurais, elas estão submetidas a uma cultura patriarcal acirrada né, que coloca essas mulheres num lugar de extrema submissão, diante dos seus cônjuges, e isso faz com que elas aceitem situações de violência, tenham dificuldade de reconhecer aquela situação que elas estão vivenciando como violência”.

Os dados da tese 'A violência conjugal em contextos de ruralidade', defendida em junho do ano passado, foram coletados por Aline Martins entre 2014 e 2015, quando visitou comunidades camponesas em Minas Gerais. Ela conta uma das histórias de violação que ouviu de mulheres camponesas.

“Uma mulher que ficou dois dias amarrada numa árvore como punição do cônjuge, ela não tinha cumprido com as tarefas domésticas do dia, e eles entraram numa discussão verbal, e como punição ele deixou ela amarrada numa mata por dois dias. Então essa mulher ficou privada de fazer suas necessidades básicas, de alimentação, sofreu muitas picadas de insetos no corpo.”

Para a gerente de programas da ONU Mulheres, Ana Carolina Querino, falta às mulheres camponesas o acesso às políticas públicas já existentes, o que também dificulta a coleta de dados sobre violações nessas áreas. “Quando a gente vai pras áreas rurais, ainda é um campo com muito pouca informação, e que tá ainda muito mais longe de determinados olhares do setor público. Como que essas mulheres saem dali num momento de emergência em busca de um serviço? Eu acho que essa questão, pra além do acesso à informação, ela é um dos principais pontos que fazem com que essa seja uma área que a gente não tenha muito conhecimento sobre o que acontece”.

Dados gerais mais recentes do Conselho Nacional de Justiça apontam que, em 2016, tramitaram na Justiça do país mais de um milhão de processos referentes à violência contra a mulher, o que corresponde, em média, a um processo para cada cem mulheres brasileiras. E esses são apenas os casos de quem teve acesso à justiça e oportunidade de denunciar.

Ouça o Repórter Nacional (7h) desta quinta-feira (8) na íntegra:


 

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Criado em 08/03/2018 - 10:20

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