O 1º de Maio não será motivo de comemoração para 62 pessoas demitidas pelo Flamengo, às vésperas do feriado do Dia do Trabalhador. Após 46 dias de paralisação do futebol, por conta da pandemia do novo coronavírus, o clube mais popular do país viu-se obrigado a reduzir custos, cortando cerca de 10% dos funcionários.
"A gente fica triste, sentido, mas não temos muito o que fazer", lamentou José Pinheiro, presidente do Sindicato dos Empregados em Clubes, Federações e Confederações Esportivas (Sindeclubes). Segurança do Flamengo há 45 anos, Pinheiro pontua que, diferente de outros períodos, os trabalhadores vão receber todas as verbas rescisórias e que o clube, como empregador, também está dentro do direito de reduzir a folha de pessoal. "Poderíamos protestar, mas neste momento não teria jeito. Vivemos uma fase triste", diz.
O Flamengo também vai reduzir em 25% o salário dos funcionários que ganham mais do que R$ 4 mil. O caminho é o mesmo que outros 80% dos clubes da Séria A do Brasil estão adotando. Entretanto, a maioria vem buscando poupar os que ganham menos. O Palmeiras, por exemplo, optou reduzir este mesmo percentual dos rendimentos de atletas e comissão técnica. "Esta crise implica em questões éticas delicadas nas relações entre clubes e profissionais. Mas configura um certo absurdo e provoca protestos na sociedade e nas redes sociais, o Fla não mexer, aparentemente, nos astronômicos vencimentos dos jogadores e atingir os funcionários mais pobres", analisa o comentarista esportivo, Márcio Guedes, criticando a medida da diretoria rubro-negra. "Qualquer planejador de meia-tigela, encontraria uma solução melhor. É injusto e não faz sentido um clube de massa, com milhões de torcedores de baixa renda, voltar-se contra os mais humildes", ressalta o jornalista, setorista do mais querido nos tempos de Zico.
O sócio e conselheiro do Flamengo, David Butter, também estranhou esta decisão, principalmente porque está publicado no site a demonstração financeira do clube, pontuando que ele poderia suportar por três meses a pressão econômica provocada pela Covid-19. Neste mesmo texto, o Flamengo também ressalta a preocupação com a segurança dos funcionários. "Vamos questionar e tentar entender nesta hora mais sombria porque cortar na cadeia salarial mais baixa. Entendemos que agora é preciso preservar os vínculos e cumprir parte de uma missão de responsabilidade social", avalia Butter, que também integra o grupo Flamengo da Gente. "Quem pode dizer se isto poderia ser evitado ou não é a diretoria e o Conselho Diretor. Eles têm os elementos de decisão para nos dar uma resposta plena", explica.
Procurado pela reportagem da Agência Brasil, o Flamengo disse que não vai se manifestar sobre o caso.
De acordo com o consultor da Ernest Young, Alexandre Rangel, todas as receitas dos clubes estão travadas e a previsão é que o quadro se agrave. "As autoridades não sabem dizer quando o futebol pode voltar. Há um cenário de indefinição e a tendência é que todos os artifícios legais sejam usados: redução de salários, suspensão de contratos de trabalho e demissões. É inevitável", aponta Rangel, destacando ainda que mesmo com a volta da normalidade, o dinheiro leva, em média, de 90 e 120 dias para entrar no caixa dos clubes. "Isso é só o começo do movimento, desesperadora para a maioria e para alguns ainda controlável".