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Marca Página: dicas de leitura para a experiência da maternidade

Com um olhar afetivo, Priscila Kerche sugere opções de livros e textos para quem quer ser mãe

Tarde Nacional - São Paulo

No AR em 10/04/2025 - 16:30

A coluna de hoje encerra a primeira temporada do Marca Página, coluna literária produzida por Priscila Kerche para o programa Tarde Nacional da Rádio Nacional SP.

O texto abaixo é a transcrição da coluna. Priscila vai se ausentar por um tempo porque em breve vai trazer ao mundo Lavínia, sua primeira filha.

Por isso, optamos por deixar o texto abaixo em primeira pessoa, tal como Priscila conversa com a gente nessa sua última coluna antes de dar uma pequena pausa na rádio.

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A gente ainda não tinha comentado por aqui, mas estou gestando uma menina: a Lavínia.

E, antes de sair para minha licença-maternidade, o Victor [Ribeiro, apresentador do programa Tarde Nacional SP] sugeriu que eu falasse sobre livros que abordam esse tema.

O que a gente já comentou é que eu também escrevo, e acho que o que eu andei lendo em relação à maternidade tem muito da forma como se dão minhas pesquisas pessoais, que acabam em escrita.

Então, alguns conteúdos que eu trouxe aqui para a coluna desde o ano passado já davam pistas dessa maternidade que me rondava.

E a gestação, em si, me colocou em um estado de tempo muito parecido com aquele em que a poesia me coloca.

Talvez pelos hormônios, talvez pela alegria de um desejo que eu tinha — ou do grande mistério que é tudo isso.

Eu acho que eu li mais sobre maternidade antes de engravidar. Foi meu jeito de me aproximar disso, e, nos últimos meses, eu acabei só vivendo a experiência.

Então, no Dia das Mães do ano passado, eu trouxe os livros da Sheila Heti, "Maternidade", em que a protagonista investiga a falta de vontade de ser mãe; o livro da Juliana Krapp," Volta pela Lagoa", que traz um poema com perspectiva alternativa sobre o aborto; e um poema do livro da Diane Di Prima, em que ela fala do desejo de ser mãe.

Poetas mães, como a argentina Cecilia Pavón — que foi tema de uma das últimas colunas —, têm seu trabalho atravessado pela presença dos filhos. Entre elas, eu pontuo aqui também as brasileiras Ana Estaregui, no livro "Dança para Cavalos"; a Sofia Mariutti, no "Abrir a Boca da Cobra"; e a argentina Laura Wittner, em "Tradução da Estrada". Todos livros editados pela Círculo de Poemas.

Politizando o assunto, para pensar a condição de mãe, a autora italiana Silvia Federici fala sobre a reprodução e o cuidado como trabalhos não remunerados nos livros "O Calibã" e a "Bruxa: Mulheres, Corpos e Acumulação Primitiva" e "O Ponto Zero da Revolução: Trabalho Doméstico, Reprodução" e 'Luta Feminista", os dois publicados no Brasil pela Editora Elefante e traduzidos pelo Coletivo Sycorax — por isso, disponíveis para download gratuito em PDF na página do coletivosycorax.org

Mas, se eu fiz alguma leitura com finalidade de me preparar, foi para o parto. Eu defendo, como primeira opção, o parto normal e recebi como indicação da minha professora de ioga o livro "Guia do Parto," da parteira americana Ina May Gaskin. Na década de 1970, ela fundou uma fazenda para ser um ambiente propício para mulheres darem à luz nos Estados Unidos, em que as mulheres teriam contexto para deixar o parto acontecer. Ela escreve a partir dessas experiências. O livro traz registros de como a medicina vem lidando com o parto ao longo da história e traz uma sessão de relatos de parto.

O "Guia do Parto" foi traduzido para o português e publicado pela editora paranaense Matrescência recentemente, em 2023. Essa editora tem muitos outros livros sobre maternidade — vale dar uma olhada no catálogo.

O livro me colocou em contato com um vocabulário que eu não estava acostumada a associar com a experiência do parto. Palavras como “gratidão”, “rendição” — e que eu juntei com outra bastante importante dita pela minha doula: “alegria”. Além da dica para enfrentar o medo e a dor: respirar.

Outra coisa que eu li também foi o diário que minha mãe escreveu durante a minha infância, com registros mensais nos primeiros anos e anuais nos anos seguintes — uma forma de transmitir experiência. É um caderno amarelo, um pouco mais fino que o caderno verde em que ela escreveu o diário da minha irmã, que veio primeiro. Nele, ela relata com afeto anseios, impressões, preocupações e contentamentos na relação entre ela e eu.

A minha mãe morreu quando eu tinha 19 anos e, agora, quando surgiram questões no pré-natal, foi ao diário que eu recorri para encontrar registros sobre meu nascimento. O meu primeiro livro de poemas, o "Tuia", publicado pela Laranja Original depois de ser selecionado em uma chamada aberta, fala da ausência da minha mãe — por isso, me interessa de muitas formas a relação que estou construindo com minha filha.

Acho que, depois de colocar nossa filha no mundo, vai existir tempo para ler o que for condizente com as fases da criança — muita literatura infantil — e tirar da estante o livro do psicanalista Donald Winnicott, que fala da criação de filhos. Ele, inclusive, teve uma coluna na rádio BBC de Londres, e a reunião desses textos deu origem ao livro "Falando com Pais e Mães", editado pela Ubu.

Por sugestão da minha terapeuta, eu deixo vocês com um poema que eu escrevi sobre um pouco de tudo isso, que acho que é o melhor que eu tenho a oferecer. Pensando também na minha mãe, que compartilhou a experiência dela por meio de um diário.


"a mãe olha em volta
quando o bebê ainda está na barriga
pra não ir embora
sem o bebê junto


como se o bebê já tendo vida
estivesse fora
e fosse preciso
segurar a mão
 

o bebê antes de tudo é uma ideia
que desperta o amor próprio
quando se quer amar o outro
 

é preciso cuidar do próprio corpo
cuidar da casa
e uma mãe acaba responsável
por cuidar do bebê ainda na ideia


anda por aí com mais atenção
 

antigos prazeres perdem a graça
e a cor passa a existir no desejo
de ser mãe
 

um bebê amado
antes de ser gestado
antes de ser parido
é uma alegria na vida
que existe antes
de existir"

Criado em 10/04/2025 - 16:30

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